Por Feifiane Ramos, do ATUAL
MANAUS — É inevitável, e urgente, conciliar desenvolvimento econômico e preservação ambiental, afirma Márcio de Miranda Santos, presidente do CBA (Centro de Bionegócios da Amazônia), de Manaus. Segundo ele, a exploração excessiva dos recursos naturais e os impactos climáticos cada vez mais intensos são incontestáveis e emitem sinais de efeitos catastróficos. Para Márcio de Miranda, é preciso integrar de maneira mais eficiente as preocupações com o meio ambiente nas decisões econômicas.
“Cada dia que passa fica mais perceptível para a sociedade, para os próprios empresários, para os formuladores de políticas públicas, que não é isso que nós queremos. Temos que incorporar, de uma certa forma, na mesma intensidade, a preocupação com o meio ambiente e a preocupação com o social”, afirmou Santos ao ATUAL no Fórum Jovens Cientistas sobre Ecointelegência para o Futuro, na sexta-feira (4), em Manaus. O evento reuniu cientistas e investidores chineses.
De acordo com ele, a ideia é que o desenvolvimento econômico não seja mais tratado isoladamente das questões ambientais e sociais. “Não adianta nada eu ter empresas enormes ocupando nichos importantes de mercado a nível local, nacional ou global, se a população não se beneficia de alguma maneira. E, nesse particular, o próprio meio ambiente”, afirmou.

O especialista diz que, hoje, as estratégias empresariais precisam considerar não só o retorno econômico, mas também o impacto social e ambiental das ações. “O que se está fazendo é incorporar estratégias que conversem com essas, pelo menos essas três dimensões”.
Questionado como pode haver essa “harmonia” entre a economia e meio ambiente, Márcio de Miranda diz ser necessário haver um equilíbrio entre três períodos de tempo: passado, presente e futuro. “É uma questão de fazer avançar as três dimensões. Não adianta você acabar com os recursos naturais, porque em grande medida alguns deles são finitos, outros são renováveis […] não se olhe só para trás ou pelo presente, que a gente tenha um olhar também no futuro”, afirma o especialista em genética vegetal e pesquisa em recursos genéticos para a agricultura e alimentação.
Regeneração de produtos
Chen Chen, pesquisadora do Instituto Sul da China de Ciências Ambientais, vinculado ao Ministério de Ecologia chinês, foi questionada sobre como o país, um dos maiores consumidores de recursos naturais do mundo, pretende equilibrar economia e meio ambiente. Ela disse que a China está pesquisando métodos de “regeneração” de produtos.
“A gente está estudando fazer a regeneração de todo produto para que assim não seja usado só uma vez, mas para aproveitar outras vezes e com isso diminuir a poluição que pode destruir o meio ambiente”, disse.
Na China, segundo a pesquisadora, esse equilíbrio é urgente e o governo exige a contrapartida das empresas ao fechar um negócio. Uma delas é que a empresa se comprometa com a sustentabilidade.
“Não tem conflito porque lá na China tem uma lei rígida, que diz: ‘você tem que fazer a preservação e proteção do meio ambiente e isso já está dentro do regulamento. Por isso, ninguém pode furar’. Ao fechar um acordo, já tem essa exigência”, revelou.
Elias Moraes de Araújo, diretor-executivo da FUEA (Fundação Universitas de Estudos Amazônicos), disse que o evento é uma oportunidade que com a ajuda do “capital intelectual” de cientistas seja possível o fortalecimento da economia e desenvolvimento da Amazônia.

Eventos extremos
Nos últimos anos, o Amazonas enfrentou uma das secas mais severas da história. Em 2023 e 2024, o nível dos rios atingiu recordes históricos com consequências graves para a população e para a economia local. Para Márcio Santos, este é somente um exemplo de como os fenômenos climáticos extremos têm se intensificado e refletido as mudanças que afetam não só a região, mas todo o planeta.
“Não há dúvida hoje para mais ninguém que nós vamos estar vivendo, doravante [e agora em diante], um ambiente em que eventos extremos do clima vão estar acontecendo com uma frequência muito maior do que aconteciam no passado”, disse Santos. Segundo ele, as secas e as cheias no Amazonas são um reflexo direto de um padrão climático cada vez mais frequente que exigirá uma adaptação urgente, tanto das populações locais quanto das políticas públicas.
O presidente do CBA cita que as comunidades mais vulneráveis, como aquelas que vivem nas margens dos rios e no interior da floresta, precisarão se ajustar a um futuro de eventos climáticos extremos. “Esses desafios vão desafiá-los a continuar produzindo e vivendo no mesmo local”.
Santos diz que os fenômenos não afetam somente comunidades em áreas rurais, mas as cidades também enfrentam sérios desafios com o impacto no comércio, na educação e em diversas áreas da infraestrutura urbana.
“Percebendo que essas secas vão se repetir e eventualmente grandes cheias vão acontecer, é preciso que as políticas públicas se adaptem a essas situações”, afirmou. Caso contrário, alerta o especialista, o impacto social será significativo e poderá agravar ainda mais as condições de vida da população.
No caso da pesca e do manejo de espécies como o pirarucu, por exemplo, a adaptação às secas e às cheias extremas precisa ser parte do planejamento diário. “Como é que eu faço isso numa grande vazante? Como eu faço isso numa cheia extrema?”, indaga. A resposta a essas questões, segundo ele, exigirá novos modelos produtivos e políticas que integrem as necessidades de preservação ambiental com as exigências da produção sustentável.

“Os eventos extremos vão ser mais frequentes, então a ciência e as políticas públicas terão que se adaptar aos eventos e não o contrário”, reforça Márcio de Miranda Santos. A pesquisa e o desenvolvimento de novas tecnologias, como variedades agrícolas resistentes à seca, são algumas das soluções que podem ajudar a mitigar os efeitos dessas mudanças.
Porém, para que as estratégias de adaptação e mitigação sejam eficazes, o desmatamento na Amazônia precisa ser combatido. “O desmatamento não pode continuar como está, caso contrário esses eventos podem chegar a um ponto de não retorno, em que a gente não consiga encontrar uma solução adequada para a qualidade de vida da população”. afirma o pesquisador. Para o presidente do CBA, sem o controle do desmatamento os esforços para lidar com os extremos climáticos se tornarão cada vez mais desafiadores.
Conforme Márcio Santos, o momento é de agir com urgência e responsabilidade, não apenas para adaptar as populações às novas condições climáticas, mas também para garantir que as futuras gerações possam viver de forma sustentável e equilibrada.
Negacionismo
O presidente do CBA comentou também sobre o negacionismo ambiental e a influência nas políticas públicas. Para ele, a comunicação e a conscientização são fundamentais para combater esse tipo de resistência.
“A sociedade tem que ser muito bem informada, ela tem que ser conduzida de uma certa forma, por estratégias de comunicação em grande escala que permitam a elas compreenderem o seu comportamento em relação a essas coisas […] Definitivamente não vai ser bom para ninguém se o negacionismo climático prosperar na sociedade numa escala maior do que já aconteceu”, enfatizou.
O enfrentamento das mudanças climáticas exige ação rápida e coordenada. “O mais importante agora é a adaptação. Se nós não nos adaptarmos rapidamente, a situação pode se agravar ainda mais. A questão não é ‘quem está ganhando ou perdendo’, mas como podemos aprender e nos preparar para esses eventos extremos que são cada vez mais frequentes”.